Ser alguém comum nos incomoda imensamente. Sentimos
necessidade de nos sentirmos especiais e gostaríamos que os outros assim também
nos vissem. Nos diluir na multidão parece ser sinônimo de aniquilação da nossa
individualidade. Um duro golpe no nosso ego sempre oscilante e carente de
autoafirmação.
Esta talvez seja uma das explicações para o sucesso
das histórias de super-heróis desde a antiguidade. Assim como um jovem grego
qualquer deveria sonhar com a possibilidade de acordar um belo dia e
descobrir-se filho de um deus e que todas as suas angústias perante o mundo e
sua falta de adequação ao que o cercava se devia justamente a sua estirpe
elevada, sua meia-parte divina e, portanto, superior ao resto dos reles mortais
dos quais ele se envergonhava de certa forma, mas que a partir de então seria
motivo de inveja alheia e de admiração de todos aqueles que antes o olhavam com
ar de repreensão, também os jovens atuais parecem sonhar com o dia em que se
perceberão superiores e de alguma forma apartados da realidade que parece oprimi-los
de diversas formas.
Das narrativas de seres mutantes, com uma genética que
lhes confere super poderes, filhos de alienígenas ou mesmo pessoas que passaram
por experiências que lhes conferiram aptidões diferenciadas o princípio que
norteia essa lógica e que faz com que tantos se sintam atraídos por ela é o
mesmo, o da transcendência do comum, da extrapolação da mediocridade mundana
para um estado superior de capacidades físicas e mentais, de saber e poder mais
do que o resto dos seres humanos que nos rodeiam.
A sensação de impotência e invisibilidade perante o
resto das pessoas oprime de tal forma que a possibilidade, ainda que remota, de
que um dia possamos nos descobrir como seres diferenciados e superiores nos
seduz facilmente. E mesmo quem não se ilude com esse grau de credulidade acaba
por buscar numa posição política a ideia de que está do lado correto da
situação e, portanto, do lado do “bem”, ou busca numa crença religiosa o
consolo de que é “filho de Deus”, portanto alguém importante no mundo e não
mais um qualquer.
Quem sabe um dia não acordemos e nos demos conta de
que nossos pais são os nossos pais mesmo, que não viemos de uma galáxia
distante e nem nossa genética possui nada de diferente dos mais de sete bilhões
de humanos que conosco dividem este pequeno planeta. Que não somos especiais e
mesmo as nossas insatisfações e a sensação de impotência perante tantas
situações são mais comuns do que pensamos e não são exclusivas nossas. Que a
inadequação é característica da maioria das pessoas, que estamos do lado da
maioria e não de um seleto grupo como julgamos frequentemente. Nesse dia talvez
tenhamos a coragem de parar de olhar nossos umbigos e lancemos um autêntico
olhar para o mundo ao nosso redor e aí então possamos identificar realmente
nossas características divergentes e aquilo que podemos fazer para nos
diferenciar e acrescentar ao mundo para evitar o nosso maior medo: passar uma
vida em branco e sem sentido, esperando o dia em que seremos esquecidos totalmente
por não termos sido nada que causasse uma diferença significativa na vida das
pessoas e na história do planeta. Uma estrela cadente que ninguém assistiu a
queda, uma árvore que caiu na mata e ninguém ouviu o barulho. Alguém que foi
sem ter sido, sombra na noite escura, ser que foi nada...
Entretanto, antes de encarar esses pensamentos,
preferimos cogitar que possamos ser Clark Kent ou Percy Jackson.
Augusto, é inerente ao ser humano esta atitude de colocar-se num patamar superior, esquecendo -se de suas fragilidades e limitações. Apreciei seu texto, pois leva-nos a uma ponderação sobre o real conceito que devemos ter sobre nós, bem como de nosso pretensioso desejo de obter poder. Parabéns!
ResponderExcluirObrigado, Jesus. Agradeço imensamente o seu comentário.
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