Abandonar a zona de
conforto virou um grande jargão ultimamente, utilizado em larga escala tanto no
sentido profissional quanto no pessoal. Todos os gurus, coaches e conselheiros
em geral, de qualquer especialidade, recomendam. O discurso já está tão
introjetado nas pessoas que ninguém mais parece discordar que isso seja algo
positivo e que auxilia as pessoas a se tornarem melhores no que quer que seja. No
entanto, o efetivo exercício de sair dessa zona que nos parece tão cara, por
mais que a ela sempre nos refiramos negativamente, é algo bem mais complicado
do que pode aparentar a princípio.
A zona de conforto é a
nossa área de segurança, o conhecido, onde estamos estabelecidos e nos sentimos
de certa forma no controle. Não significa que seja algo que nos faça bem ou que
gostemos de estar nela, mas sim uma situação onde podemos prever os eventos,
mesmo que negativos. E deter um certo grau de compreensão a respeito daquilo
que se refere a nós e ao nosso mundo nos é muito agradável, dá-nos a impressão
de que podemos antever os acontecimentos e, desta forma, coloca um chão firme
sobre os nossos pés. Ninguém gosta de caminhar sobre um solo movediço.
Por outro lado, pode nos causar
a sensação de estagnação, de angústia, de que não se está realmente vivendo. A zona
de conforto, para quem possui um espírito menos acomodado pode ocasionar a
sensação de que a vida não está sendo vivida em sua plenitude, que ela deveria
ser mais do que o pequeno espaço onde tudo pode ser de alguma forma
racionalizado e tornado previsível. E é aproveitando-se dessa insatisfação ou
procurando produzi-la que atualmente se estimula tanto o abandono dessa região
para alça voos mais longos e ousados.
Porém, deixar a zona de
conforto é automaticamente se colocar em uma espécie de zona de risco. A zona de
risco é a situação em que o conforto é abandonada ou retirada do indivíduo. Suas
certezas, sua segurança e sua forma de conceber as coisas e as relações
interpessoais são colocadas em cheque e pedem alterações, na maioria das vezes
bruscas e significativas. Desta forma, a intenção é permitir uma vivência mais
efetiva das oscilações da vida, seu aspecto imprevisto e trágico. Aceitar essa
condição é lançar no desconhecido, na aventura e no desafio.
Entretanto isso não traz
apenas sensações agradáveis. Pode acarretar também a falta de referências, de
pertença, de um “porto seguro”. O desamparo de quem abandonou uma segurança
para a qual não pode mais voltar em busca de um objetivo que talvez não venha a
alcançar. Estar em um solo que não oferece firmeza é uma tarefa que exige um
grau de autocontrole e perseverança que nem todos são capazes de ter.
Por isso é fácil perceber
que por mais que as pessoas sejam unânimes em dizer que seja algo positivo
abandonar a zona de conforto, poucos se aventuram realmente para fora de seu
espaço conhecido em busca de objetivos mais elevados. E que muitos que o fazem
acabam por se perderem na travessia por falta de requisitos para concretizar tal
feito. Outros ainda tentam retornar com os rabos entre as pernas para a antiga
segurança, na esperança de reavê-la, amaldiçoando o dia em que se perderam em
devaneios em busca de sonhos que não eram para si. Esses últimos, rebatendo os
profetas da mudança, subirão também em algum palanque para dar testemunho do
quanto essas ideias são perniciosas, estimulando as pessoas ao abandono do bom
caminho para perseguir nuvens que simplesmente os desviarão do rumo correto.
A situação é complexa e
ambas as partes possuem uma certa verdade no que dizem. A mudança constante
impede vínculos efetivos e provoca uma sensação de se estar sem raízes, no
campo das relações humanas isso pode ser bastante prejudicial. Já no campo
científico, cognitivo e naqueles que demandam maior atitude para atingir metas
e objetivos a estagnação é sinônimo de atraso, retrocesso e tende a atrapalhar
a quem não se dispõe a se mobilizar.
Em geral as pessoas
sofrem com esse dilema, e sofrem principalmente por não terem a habilidade de
estabelecer quais são os temas em que se deve levar em consideração a zona de
conforto ou a zona de risco. Se arriscam em questões em que deveriam buscar
conservar o modelo, a forma consolidada, e se acomodam em situações que
demandam mais atitude e a coragem de aceitar o novo. Mas no fundo ninguém pode
ser cobrado além de suas limitações, a vida não vem com um manual de
instruções. E ao contrário do que apregoam os gurus e coaches, as questões são
bem mais difíceis de se analisar do que parecem e alcançar o equilíbrio não é
tarefa que se cumpre efetivamente de primeira.
Caminhamos no escuro por
uma trilha que não podemos enxergar, ouvindo vozes de todos os lados nos
chamando tomar as mais variadas direções, e outras ainda nos dizendo para
permanecer no mesmo lugar onde nos encontramos porque qualquer movimento é
perigoso. O único método à disposição é o da “tentativa e erro”. O medo de
errar gera estagnação, escolhas erradas geram também, ou então a intemperança
que nos faz agir impulsivamente o tempo todo sem pesar as possíveis consequências.
Nesse momento o único consolo que vem à mente é a frase do personagem Riobaldo,
em Grande Sertão: Veredas: “viver é um negócio perigoso”. A frase não resolve o
problema, mas esclarece o contexto para quem ainda não entendeu.
Parabéns!!!! Seu artigo maravilhoso, pena que muitas pessoas não deixam a zona de conforto para vivenciar o novo, creio que o novo é algo que exige muito equilíbrio mental e motivação.
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