Muito se fala que a sociedade em que vivemos é individualista, que as pessoas só pensam em si mesmas e não se importam com o próximo. O indivíduo, por definição, “aquele que não se divide”, que possui uma dimensão própria e inconfundível com qualquer outro ser, deveria, com base nessa delimitação de significado, ter uma dimensão pessoal bem definida e isolada dos outros seres.
Mas qual é o verdadeiro espaço da individualidade humana em um mundo que nos exige a todo momento que compartilhemos tudo o que se passa conosco seja por fotos, mensagens em redes sociais (que hoje mais se assemelham a diários abertos, bem diferentes dos antigos que eram secretos), comportamentos extrovertidos e isentos de timidez... Enfim, vivemos em um mundo dito individualista, mas no qual não há um espaço reservado para o indivíduo e sua singularidade. Tudo o que se passa com os indivíduos tem que ser imediatamente divulgado seja comentando no Twitter, Tmbler ou Facebook, postando as fotos dos lugares, pessoas, sanduiches ou pratos de comida para dizer e comprovar que se está realmente fazendo aquilo que se disse. Parece que só se tem uma existência autêntica na medida em que se aparece, não se oculta nada do que se faz e todo pensamento, por mais ínfimo que seja, tem que ser imediatamente divulgado.
O maior dos pecados nos nossos tempos é esconder-se. Alguém fora das redes sociais é um pária da sociedade, um sujeito deslocado e marginal. Talvez até perigoso. Os tímidos também, dentro dessa perspectiva, representam um grupo muito ensimesmado, que não se divide demais e nem se expõe exageradamente, algo considerado muito nocivo e que lhes afasta não só dos amigos como também das oportunidades de trabalho, relacionamentos e vantagens que a sociedade disponibiliza.
A individualidade como um espaço pessoal e íntimo deixa praticamente de existir. O que existe é uma ideia de individualidade ligada ao hedonismo e ao exibicionismo típico de nosso tempo, que de forma alguma condiz realmente com um espaço reservado e privativo de um ser uno e indivisível, realmente capaz de viver por si e para si, não se dividindo em sua suposta essência com nada e nem ninguém. O indivíduo atual é simplesmente um devir de aparências que tendem a se atualizar o tempo todo para se auto afirmarem, sob pena de se cair no esquecimento caso suas postagens não sejam atualizadas continuamente, condicionadas a aprovação alheia através de comentários, compartilhamentos e curtidas. O indivíduo é uma propaganda de um produto que não quer sair do mercado, por isso acaba por se perder na coletividade fugaz das modinhas, virais e ondas momentâneas, tentando afirmar-se pela participação no todo. Não seria essa uma total contradição do conceito? Para ser indivíduo é preciso diluir-se e generalizar-se. Só é indivíduo quem participa e se confunde com o geral. Uma clara demonstração de que a Escola de Frankfurt ainda tem algo a nos dizer.
Vivemos em um mundo globalizado, nitidamente multicultural, multifacetado, onde diversas perspectivas e visões de mundo interagem o tempo todo. Convivemos o tempo todo com pessoas que possuem gostos, preferências, ideias, visões de mundo muito diferentes das nossas e muitas vezes até batemos no peito para enfatizar a “beleza” dessa diferença entre as pessoas. Mas será que esse discurso de exaltação da diferença é mesmo genuíno? A diferença é para nós o tempero que deixa a vida mais saborosa ou aquilo que justamente amarga as nossas bocas e nos tira o bom humor? Quando se pensa nas intermináveis guerras de torcida, acusações entre as igrejas e seus membros sobre qual seria a “mais verdadeira”, a que não “serve ao inimigo”, e outras alegações afins, nos partidos políticos que não se entendem e elevam suas divergências para além do bem da população pela qual deveriam zelar, além de outros tipos de preconceitos quanto ao gosto musical, estilo de se vestir, classe social, cor de pele, orie...
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