Pular para o conteúdo principal

Dilemas da contemporaneidade


O advento da Internet indubitavelmente nos trouxe uma profusão de novidades, ideias, conhecimentos, que por outra forma teríamos muita dificuldade em acessar. Com um simples clique, ou alguns, temos contato com uma infinidade de coisas que talvez não tivéssemos coragem de perguntar ou tempo para procurar em outros lugares. A democratização da informação, e até mesmo o excesso de bombardeamento que sofremos mesmo sem querer com tantos estímulos recebidos nos provoca um acerta sensação de exaustão em meio a tanta coisa sendo falada, oferecida, divulgada, tantos convites para redes sociais, causas humanitárias, posicionamentos diversos sobre temas polêmicos... A Internet parece não mais um lugar de fuga da realidade, como se alegava até um tempo atrás (ou mesmo ainda hoje), mas uma nova arena social, onde mesmo no conforto do nosso lar somos invadidos e estimulados o tempo todo, sabendo que um determinado grupo espera uma postura de nossa parte à qual podemos aceitar ou declinar, colhendo os frutos ou as censuras de cada decisão tomada. Um terreno arenoso para as relações sociais, que ainda nem havíamos conseguido traçar caminhos seguros pessoalmente, agora também temos que pensar em como somos vistos pelos que nos veem na grande rede mundial. A divulgação de ideias e conhecimentos facilitou e possibilitou nosso contato com pessoas que pensam igual ou que falam o que gostaríamos de ouvir, que dão conselhos ou que apontam o que consideramos errado em nossa sociedade. E também criou terreno fértil para a divulgação de todo tipo de futilidades e preconceitos travestidos de atitude ou intelectualidade. Obviamente isso sempre existiu, mas com a Internet a propagação ganhou proporções inimagináveis, fazendo com que idiotas com um mínimo de retórica sejam adorados como genuínos representantes de uma causa nobre e justa, combatida por forças adversárias, que dominam o poder querem levar a população à ignorância, ao inferno, a miséria ou seja lá o que for. Utilizando-se de uma lógica própria, que muitas vezes distorcem ou ignoram os fatos, esses paladinos de um ideal específico arrebanham uma legião de seguidores que se também se dizem defensoras de uma sociedade esclarecida, mas que por outro lado também não fazem ideia se o que está sendo falado condiz com a realidade objetiva. Fazem parte do mesmo grupo ao qual tanto criticam, os que não pensam por si mesmos e são arrebanhados por qualquer oportunista com um pouco de lábia e uma boa dose de autoconfiança. Acham que a justiça foi feita para ser aplicada com aqueles que estão do seu lado, e acham totalmente coerente a desqualificação e desumanização dos diferentes. E ainda por cima acham que estão do lado dos oprimidos e qualquer exagero de sua parte se justifica por conta da causa que defendem. Para esses, a democracia só tem sentido quando serve para ratificar aquilo que defendem, caso contrário, só serve para mascarar a “verdade”. No fim, a Internet, assim como a bebida na maioria dos casos, potencializa tudo de bom e ruim que as pessoas trazem dentro de si, seja beneficiando-se de um suposto anonimato, seja usando da sua capacidade de propagar algo em escala mundial, vemos pessoas querendo ajudar e serem ajudadas, outras querendo salvar o planeta, amaldiçoar a humanidade e outros ainda propondo uma sociedade justa e humanitária, mesmo que para isso tenha que se matar e subjugar a maioria dela e acreditam piamente que seu ódio travestido de moralismo idôneo é diferente do fundamentalismo propagado pelos Talibãs. Eis alguns dilemas da contemporaneidade.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Por que o diferente incomoda?

Vivemos em um mundo globalizado, nitidamente multicultural, multifacetado, onde diversas perspectivas e visões de mundo interagem o tempo todo. Convivemos o tempo todo com pessoas que possuem gostos, preferências, ideias, visões de mundo muito diferentes das nossas e muitas vezes até batemos no peito para enfatizar a “beleza” dessa diferença entre as pessoas. Mas será que esse discurso de exaltação da diferença é mesmo genuíno? A diferença é para nós o tempero que deixa a vida mais saborosa ou aquilo que justamente amarga as nossas bocas e nos tira o bom humor? Quando se pensa nas intermináveis guerras de torcida, acusações entre as igrejas e seus membros sobre qual seria a “mais verdadeira”, a que não “serve ao inimigo”, e outras alegações afins, nos partidos políticos que não se entendem e elevam suas divergências para além do bem da população pela qual deveriam zelar, além de outros tipos de preconceitos quanto ao gosto musical, estilo de se vestir, classe social, cor de pele, orie...

Refletir, tarefa difícil

Nossos pensamentos nos vêm à mente mesmo sem nos darmos conta deles. Por isso, quando se trata de pensar de maneira crítica sobre as coisas, principalmente nos dias tão conturbados em que vivemos, achamos que rapidamente seremos capazes de encontrar uma saída fácil e rápida para aquilo que nos aflige. Engano. A reflexão exige um desdobramento que nem todos se encorajam realmente a fazer. Questionar é enfrentar problemas, desenterrar fantasmas e encarar nossas próprias limitações. O homem não reflete por prazer e sim para solucionar questões que o afligem, por isso a atitude reflexiva apesar de parecer algo simples, nos causa tanto desconforto e a maioria prefere não fazê-la constantemente. Alguns a evitam a qualquer custo. Quem se dedica a essa atividade seja por hobby ou profissão é considerado um sobre-humano ou alguém com algum tipo de problema. Desta forma, rapidamente vemos que as pessoas tendem a aceitar soluções “mágicas” oferecidas por qualquer oportunista em vez de assum...

Vivendo de passado

É interessante perceber como boa parte das pessoas ao sentirem-se oprimidas ou receosas quanto ao presente ou ao futuro sempre acabam por se refugiar no passado. O futuro é incerto, o presente muitas vezes é desfavorável, mas o passado já aconteceu, não pode mais voltar, e quando ele não nos traz boas recordações pode facilmente ser moldado consciente ou inconscientemente para se adequar às nossas expectativas e nos parecer melhor do que foi realmente. Refugiar-se no passado oferece segurança e consolo para aqueles que têm medo de encarar a vida e seus percalços, pois no passado encontram uma zona de conforto, onde os acontecimentos desagradáveis podem ser repensados e melhorados de forma a parecer que não foram tão ruins assim, que serviram de aprendizado, que de alguma forma se justificam e que o passado foi bem melhor do que os dias atuais ou mais sólido do que as perspectivas voláteis do futuro. Com base nessa forma de pensar passam a exaltar os antigos amores, o comportamento do...