Pular para o conteúdo principal

Aos “amantes” dos animais


Nos últimos tempos, e principalmente nas últimas semanas, vem sendo levantado um grande debate sobre os direitos dos animais e do papel dos grupos de defesa dos mesmos. Apesar do grande avanço da tecnologia e da substituição progressiva do uso de cobaias animais por outros tipos de análise de novos medicamentos, cosméticos etc. ainda podemos perceber que em muitos setores a sua utilização em lugar de seres humanos para testes em geral é praticada sem maiores constrangimentos. Obviamente, poucos dirão que os maus tratos ou mesmo a exposição desses animais a produtos que podem ser nocivos é algo desejável ou que o tratamento recebido por eles deva ser degradante ou violento. Porém, o que choca em alguns integrantes desses grupos defensores dos direitos dos animais é o total desprezo pelo ser humano em relação ao afeto que demonstram pelos bichos que defendem, como se o amor por uma espécie implicasse necessariamente o desdém pela outra. Não faltam comentários de os animais são preferíveis aos seres humanos porque ao contrário destes, os animais não traem, não te decepcionam, não possuem todas aquelas más qualidades típicas do ser humano. As acusações feitas aos humanos não são de todo infundadas, mas seria muito simplista e inocente comparar a complexidade das relações humanas com aquelas que se estabelece com outras espécies animais, e ainda por cima estabelecer a mesma regra para avaliar ambas como se fossem do mesmo tipo. Os animais de estimação, por exemplo, são majoritariamente dependentes de seus donos, e nem possuem consciência de que existem outras formas de convívio que não aquelas a que foram submetidos desde que eram filhotes. Dependem totalmente do ser humano para comer, para sair dos limites da casa e tudo o mais, portanto não é de se estranhar que não façam nenhum tipo de mal contra aqueles a quem devem todo o bom funcionamento de seu mundinho. Assim, fica fácil entender porque um cachorro fica tão feliz em ver o dono voltando pra casa, pois ali está representada a razão de sua alimentação, passeio, convívio, todo o eixo no qual está apoiado seu universo e sua razão de ser. O mesmo não ocorre com os seres humanos, por melhor que você trate um filho, namorado, amigo ou o que quer que seja, ele terá sempre a companhia de outros para comparar com a sua, sabe que existem outras opções além de você para um monte de coisas, inclusive algumas que você não pode lhe oferecer, ou não quer, sabe que pode se virar bem sem a sua ajuda, que a forma como é tratado pode não ser a melhor e pode se dar o direito de experimentar outras... Enfim, isso tudo é muito mais complexo do que limpar um aquário ou trocar o conteúdo de uma caixinha de areia. Essa postura de se colocar animais e seres humanos no mesmo patamar para se traçar comparações muitas vezes evidencia a falta de habilidade de determinadas pessoas em estabelecer convívios sociais de qualidade entre seus pares e que, por medo de todo o risco e perigo que correm aos conviverem com os seres humanos, optam pelo convívio mais simplificado com aqueles sobre os quais podem exercer um efetivo controle, aqueles que nem serão capazes de se conscientizarem do grau de dependência e aprisionamento ao qual estarão sendo submetidos e que ainda depois de estarem nessa condição que para qualquer ser humano se caracterizaria como cárcere privado, infantilização, usurpação de autonomia, dentre outras coisas, ainda terão uma expressão tranquila, um rabinho abanando e uma total postura de aceitação a tudo o que se passa consigo sem nenhuma restrição enfática. No fundo, essas pessoas por não poderem fazer dos seres humanos tudo aquilo que desejavam, meros meios para satisfazerem a si próprias, inconscientemente projetam essa expectativa nos animais que defendem, como se fossem esses a tábua de salvação para esse mundo tão hostil que os humanos criaram e que por não poderem se impor nesse contexto, criam um outro paralelo e lá fazem o seu refúgio, seu pequeno mundinho onde tudo flui bem e os maldosos seres humanos não podem atingir.

Comentários

  1. Mudei minha maneira de pensar a respeito dos animais...
    Agora os tenho em maior estima e respeito....A divulgação sobre maus tratos me incentivou a cuidar melhor dos animais....São seres que dividem conosco o mesmo planeta...
    que esta convivência seja pacífica e que limites de relacionamento sejam estabelecidos....
    reconheço que por vezes animais recebem mais atenção que humanos....não menosprezando os animais,mas, existem humanos com qualidade de vida pior que de um cão de rua.
    A campanha para valorização e respeito com animais deve continuar....seres humanos só se conscientizam da necessidade daquilo que seus olhos vêm....

    ResponderExcluir
  2. Ótima mensagem. É uma pena que elas são maltratadas desta forma. Sorte a minha e deles por não tratá-los assim. Espero que eles tenham mais direitos quanto nós temos de defeitos.

    ResponderExcluir
  3. ótimas palavras....da até para se candidatar para redator

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Por que o diferente incomoda?

Vivemos em um mundo globalizado, nitidamente multicultural, multifacetado, onde diversas perspectivas e visões de mundo interagem o tempo todo. Convivemos o tempo todo com pessoas que possuem gostos, preferências, ideias, visões de mundo muito diferentes das nossas e muitas vezes até batemos no peito para enfatizar a “beleza” dessa diferença entre as pessoas. Mas será que esse discurso de exaltação da diferença é mesmo genuíno? A diferença é para nós o tempero que deixa a vida mais saborosa ou aquilo que justamente amarga as nossas bocas e nos tira o bom humor? Quando se pensa nas intermináveis guerras de torcida, acusações entre as igrejas e seus membros sobre qual seria a “mais verdadeira”, a que não “serve ao inimigo”, e outras alegações afins, nos partidos políticos que não se entendem e elevam suas divergências para além do bem da população pela qual deveriam zelar, além de outros tipos de preconceitos quanto ao gosto musical, estilo de se vestir, classe social, cor de pele, orie

Viver é caminhar no escuro

A vida não vem com um manual de instruções. Bem que gostaríamos que ela viesse, mas ela não vem. Por isso passamos boa parte de nossa existência pura e simplesmente tentando achar um sentido para direcionar as nossas forças e energias. Temos necessidade de verdades, de explicações que nos pareçam indubitáveis e confiáveis para guiar os nossos passos. No entanto, a vida parece sentir prazer em nos deixar sempre com uma certa desconfiança a respeito de tudo o que nos cerca e de todas as explicações que nos são apresentadas. Viver é caminhar no escuro, e cada explicação é uma lanterna que nos mostra uma possibilidade de sentido. Porém, cada lanterna possui uma coloração diferente e pinta o mundo que nos apresenta com nuances que não sabemos até que ponto refletem as características desse mundo ou da própria luz por ela emanada. A explicação não só desvenda a realidade, ela também a constrói a sua maneira e de acordo com a sua própria lógica. A lógica da explicação seria a mesma da rea

O animal e a linguagem

Aristóteles definiu o ser humano como um animal racional e dotado de linguagem. A questão de ser racional já foi amplamente explorada e mesmo utilizada para colocar a nossa espécie como superior ao resto dos animais, mas o segundo aspecto da definição aristotélica ainda é pouco considerado e não goza do mesmo grau de importância atribuído ao primeiro. Para o filósofo, a linguagem permite aos homens deliberar sobre o certo e o errado, o justo e o injusto. Desta forma, a linguagem permitiria aos seres racionais trocarem percepções entre si e construírem juntos um mundo comum que pudesse trazer o convívio harmônico e, com isso, a sociedade ideal. Infelizmente esse fator tão preponderante no ser humano não foi tratado com toda a seriedade com que se tratou a racionalidade durante todo o nosso progresso histórico. Se a racionalidade, aliada à técnica, construiu maravilhas e mesmo aberrações que ao mesmo tempo nos enchem de admiração e temor, com a linguagem parece que ainda estamos enga